A LEGISLAÇÃO FEDERAL
O decreto-Lei nº 25, de 30.11.37
Capítulo I
Do Patrimônio Histórico e Artístico nacional
Art. 1º Constitui o patrimônio Histórico e Artístico Nacional o conjunto de bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja do interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnológico, bibliográfico ou artístico.
§ 1º Os bens a que se refere o presente artigo só serão considerados parte integrante do Patrimônio Histórico e Artístico brasileiro, depois de inscritos separada ou agrupadamente num dos quatro livros do Tombo , de que trato o art. 4º desta lei.
§ 2º Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela natureza ou grandeza ou agenciados pela indústria humana.
Art. 2º A presente lei se aplica às cousas pertencentes às pessoas naturais, bem como às pessoas jurídicas de direito privado e de direito público interno.
Art. 3º Excluem-se do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional as obras estrangeiras:
1) que pertençam às representações diplomáticas ou consulares acreditadas no país;
2) que adornem quaisquer veículos pertencentes a empresas estrangeiras, que façam carreira no país;
3) que se incluam entre os bens referidos no art. 10 da introdução ao Código Civil, e que continuam sujeitas à lei pessoal do proprietário;
4) que pertençam a casas de comércio de objetos históricos ou artísticos;
5) que sejam trazidas para exposições comemorativas, educativas ou comerciais;
6) que sejam importadas por empresas estrangeiras expressamente para adorno dos respectivos estabelecimentos.
Parágrafo Único – As obras mencionadas nas alíneas 4 e 5 terão guias de licença para livre trânsito, fornecida pelo Serviço do Patrimônio Histórico e artístico Nacional.
Capítulo II
Do Tombamento
Art. 4º O serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional possuirá quatro Livros de Tombo, nos quais serão inscritas as obras a que se refere o art. 1º desta lei, a saber:
1) no Livro do Tombo Arqueológico, Etnológico e Paisagístico, as coisas pertencentes às categorias de arte arqueológica, etnográfica, ameríndia e popular, e bem assim as mencionadas no § 2º do citado art. 1º;
2) no Livro de Tombo Histórico e as cousas de interesse histórico e as obras de arte histórica;
3) no Livro do Tombo das Belas Artes, as cousas de arte erudita nacional ou estrangeira;
4) no Livro do Tombo das Artes Aplicadas, as obras que se incluírem na categoria das artes aplicadas nacionais ou estrangeiras.
§ 1º Cada um dos livros do Tombo poderá Ter vários volumes.
§ 2º Os bens que nas categorias enumeradas nas alíneas 1, 2, 3 e 4 do presente artigo, serão definidos e especificados no regulamento que for expedido para execução da presente lei.
Art. 5º O tombamento dos bens pertencentes à União, aos Estados e aos Municípios se fará de ofício, por ordem do diretor do Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional mas deverá ser notificada à entidade a quem pertencer; ou cuja guarda estiver a cousa tombada a fim de produzir os necessários efeitos.
Art. 6º O tombamento da cousa pertencente à pessoa natural ou à pessoa jurídica de direito privado se fará voluntária ou compulsoriamente.
Art. 7º Preceder-se-á ao tombamento voluntário sempre que o proprietário o pedir e a cousa se revestir dos requisitos necessários para construir parte integrante do patrimônio histórico e artístico nacional, a juízo do Conselho Consultivo do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional ou sempre que o mesmo proprietário anuir, por escrito, a notificação, que se lhe fizer, para a inscrição da cousa em qualquer dos Livros do Tombo.
Art. 8º Proceder-se-á ao tombamento compulsório, quando o proprietário se recusar a anuir à inscrição da cousa.
Art. 9º O tombamento compulsório se fará de acordo com o seguinte processo:
1) O Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, por seu órgão competente, notificará o proprietário para anuir ao tombamento, dentro do prazo de quinze dias, a contar do recebimento da notificação, ou para, se o quiser impugnar, oferecer dentro do mesmo prazo as razões de sua impugnação;
2) no caso de não haver impugnação dentro do prazo assinado, que é fatal, o diretor do Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional mandará por simples despacho que se proceda a inscrição da cousa no competente Livro do Tombo;
3) se a impugnação for oferecida dentro do prazo assinado, far-se-á vista da mesma, dentro de outros quinze dias fatais, ao órgão de que houver emanado a iniciativa do tombamento, a fim de sustentá-la. Em seguida, independentemente de custas, será o processo remetido ao Conselho Consultivo do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que proferirá decisão a respeito, dentro do prazo de sessenta dias, a contar de seu recebimento. Dessa decisão não caberá recurso.
Art. 10º O tombamento dos bens, a que se refere o art. 6º desta lei, será considerado provisório ou definitivo, conforme esteja o respectivo processo iniciado pela notificação ou concluído pela inscrição dos referidos bens no competente Livro do Tombo.
Parágrafo Único – Para todos os efeitos, salvo a disposição do art. 13º desta lei, o tomamento provisório se equiparará ao definitivo.
Capítulo III
Dos efeitos do tombamento
Art. 11º As cousas tombadas, que pertençam à União, aos Estados ou aos Municípios, inalienáveis por natureza, só poderão ser transferidas de uma a outra das referidas entidades.
Parágrafo Único – Feita a transferência, dela deve o adquirente dar imediato conhecimento ao Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Art. 12º A alienabilidade das obras históricas ou artísticas tombadas, de propriedade de pessoas jurídicas naturais ou jurídicas de direito privado, sofrerá as restrições constantes da presente lei.
Art. 13º O tombamento definitivo dos bens de propriedade particular será, por iniciativa do órgão competente do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, transcritos para os devidos efeitos em livro a cargo dos oficiais do registro de imóveis e averbado ao lado da transcrição do domínio.
§ 1º No caso de transferência de propriedade dos bens de que trata este artigo, deverá o adquirente, dentro do prazo de trinta dias, sob pena de multa de dez por cento sobre o respectivo valor, fazê-la constar do registro, ainda que se trate de transmissão judicial ou causa mortis.
§ 2º Na hipótese de deslocação de tais bens, deverá o proprietário, dentro do mesmo prazo e sob pena da mesma multa, inscrevê-los no registro do lugar para que tiverem sido deslocados.
§ 3º - A transferência deve ser comunicada pelo adquirente, e a deslocação pelo proprietário, ao Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, dentro do mesmo prazo e sob a mesma pena.
Art. 14º A cousa tombada não poderá sair do país, senão por curto prazo, sem transferência de domínio e para fim de intercâmbio cultural, a juízo do Conselho Consultivo do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Art. 15º Tentada, a não ser no caso previsto no artigo anterior, a exportação, para fora do país, da cousa tombada, será esta sequestrada pela União, ou pelo Estado em que se encontra.
§ 1º Apurada a responsabilidade do proprietário, ser-lhe-á imposta a multa de cinqüenta por cento do valor da cousa, que permanecerá sequestrada em garantia do pagamento, até que se faça.
§ 2º No caso de reincidência, a multa será elevada ao dobro.
§ 3º A pessoa que tentar a exportação da cousa tombada, além de incidir na multa a que se referem os parágrafos anteriores, incorrerá nas penas cominadas no Código Penal para o crime de contrabando.
Art. 16º No caso de extravio ou furto de qualquer objeto tombado, o respectivo proprietário deverá dar conhecimento do fato ao Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, dentro do prazo de cinco dias, sob pena de multa de dez por cento sobre o valor da cousa.
Art. 17º As cousas tombadas não poderão, em nenhum caso, ser destruídas, demolidas ou mutiladas, nem, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional serem reparadas, pintadas ou restauradas, sob pena de multa de cinqüenta por cento do dano causado.
Parágrafo Único – Tratando-se de bens pertencentes à União, aos Estados ou aos Municípios, a autoridade responsável pela infração do presente artigo incorrerá pessoalmente na multa.
Art. 18º Sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, não se poderá, na vizinhança da cousa tombada, fazer construção que impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de ser mandada destruir a obra ou retirar o objeto, impondo-se neste caso a multa de cinqüenta por cento do valor do mesmo objeto.
Art.19º O proprietário da cousa tombada, que não dispuser de recursos para proceder às obras de conservação e reparação que a mesma requer, levará ao conhecimento do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional a necessidade das mencionadas obras, sob pena de multa correspondente ao dobro da importância em que for avaliado o dano sofrido, pela mesma cousa.
§ 1º Recebida a comunicação e consideradas necessárias as obras, o diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional mandará executá-las, à expensa da União, devendo as mesmas ser iniciadas dentro do prazo de seis meses, ou providenciará para que seja feita a desapropriação da cousa.
§ 2º À falta de qualquer das providências previstas no parágrafo anterior, poderá o proprietário requerer que seja cancelado o tombamento da cousa.
§3º Uma vez que se verifique haver urgência na realização de obras de conservação ou reparação em qualquer cousa tombada, poderá o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional tomar a iniciativa de projetá-las e executá-las a expensa da União, independentemente de comunicação a que alude este artigo, por parte do proprietário.
Art. 20º As cousas tombadas ficam sujeitas à vigilância permanente do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que poderá inspecioná-las sempre que for julgada conveniente, não podendo os respectivos proprietários ou responsáveis criar obstáculos à inspeção, sob pena de multa de Cr$ 100.000, elevada ao dobro em caso de reincidência.
Art. 21º Os atentados cometidos contra os bens de que trata o art. 1º desta lei são equiparados aos cometidos contra o patrimônio nacional.
CAPÍTULO IV
Art. 22º Em fase da alienação onerosa de bens tombados, pertencentes a pessoas naturais ou pessoas jurídicas de direito privado, a União, os Estados e os Municípios terão, nesta ordem, o direito de preferência.
§ 1º Tal alienação não será permitida, sem que previamente sejam os bens oferecidos, pelo mesmo preço, à União, bem como ao Estado e ao Município em que se encontrarem. O proprietário deverá notificar os titulares do direito de preferência a usá-lo dentro de trinta dias, sob pena de perdê-lo.
§ 2º É nula a alienação realizada com violação do disposto no parágrafo anterior, ficando qualquer dos titulares do direito de preferência habilitado a seqüestrar a cousa e a impor a multa de vinte por cento do seu valor ao transmitente e ao adquirente, que serão por ela solidariamente responsáveis. A nulidade será pronunciada, na forma da lei, pelo juiz que conceder o seqüestro, o qual só será levantado depois de paga a multa e se qualquer dos titulares do direito de preferência não tiver adquirido a cousa no prazo de trinta dias.
§ 3º O direito de preferência não inibe o proprietário de gravar livremente, a cousa tombada, de penhor, anticrese ou hipoteca.
§ 4º Nenhuma venda judicial de bens tombados se poderá realizar sem que, previamente, os titulares do direito de preferência sejam disso notificados judicialmente, não podendo os editais de praça ser expelidos sob pena de nulidade, antes de feita a notificação.
§ 5º Aos titulares do direito de preferência assistirá o direito de remição, se dela não lançarem mão, até a assinatura do auto de arrematação ou até a sentença de adjudicação, as pessoas que, na forma da lei, tiverem a faculdade de remir.
§ 6º O direito de remissão por parte da União, bem como do Estado e do Município em que os bens se encontrarem, poderá ser exercido, dentro de cinco dias a partir da assinatura do auto de arrematação ou da sentença de adjudicação, não se podendo extrair a carta, enquanto não se esgotar este prazo, salvo se o arrematante ou o adjudicante for qualquer dos titulares do direito de preferência.
CAPÍTULO V
Disposições Gerais
Art. 23º O Poder Executivo providenciará a realização de acordos entre a União e os Estados, para melhor coordenação e desenvolvimento das atividades relativas à proteção do patrimônio histórico e artístico nacional e para a uniformização da legislação estadual complementar sobre o mesmo assunto.
Art. 24º A União manterá, para a conservação e a exposição de obras históricas de sua propriedade, além do Museu Histórico Nacional e do Museu Nacional de Belas Artes, tantos outros museus nacionais quanto se tornarem necessários, devendo outrossim providenciar no sentido de favorecer a instituição de museus estaduais e municipais, com finalidades similares.
Art. 25º O Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional procurará entendimento com as autoridades eclesiásticas, instituições científicas, históricas ou artísticas e pessoas naturais e jurídicas, com o objetivo de obter a cooperação das mesmas em benefício do patrimônio histórico e artístico nacional.
Art. 26º Os negociantes de antigüidades, de obras de arte de qualquer natureza, de manuscritos e livros antigos ou raros são obrigados a um registro especial no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, cumprindo-lhes outrossim apresentar semestralmente ao mesmo relações completas das cousas históricas e artísticas que possuírem.
Art. 27º Sempre que os agentes de leilões tiverem de vender objetos de natureza idêntica à dos mencionados no artigo anterior, deverão apresentar a respectiva relação ao órgão competente do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, sob pena de incidirem na multa de cinqüenta por cento sobre o valor dos objetos vendidos.
Art. 28º Nenhum objeto de natureza idêntica à dos referidos no artigo 26 desta lei poderá ser posto à venda pelos comerciantes ou agentes de leilões, sem que tenha sido previamente autenticado pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ou por perito em que o mesmo se louvar, sob multa de cinqüenta por cento sobre o valor atribuído ao objeto.
Parágrafo Único – A autenticação do mencionado objeto, será feita mediante o pagamento de uma taxa de peritagem de cinco por cento sobre o valor da cousa , se este for inferior ou equivalente a Cr$ 1.000, e de mais de Cr$ 5 por Cr$ 1.000 ou fração que exceder.
Art.29º O titular do direito de preferência goza de privilégio especial sobre o valor produzido em praça por bens tombados, quanto ao pagamento de multas impostas em virtude de infrações da presente lei.
Parágrafo Único - Só terão prioridade sobre o privilégio a que se refere este artigo os créditos inscritos no registro competente antes do tombamento da cousa pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Art.30º Revogam-se as disposições em contrário.
NOTAS
1. Esta lei, embora anterior, harmoniza-se com o disposto no art.175, da Constituição Federal de 1946, que coloca sob a proteção do Poder Público “as obras, monumentos e documentos de valor histórico e artístico, bem como os monumentos naturais, as paisagens e os locais dotados de particulares beleza”. Veja-se, adiante, a Lei Nº 3.924 , de 26/ 7 /61, que dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos.
2. O tombamento não acarreta a perda da propriedade. O bem tombado continuará no domínio de seu dono, embora com restrições ao exercício do direito de propriedade, visando à sua preservação.
3. Se o Poder Público julgar conveniente poderá desapropriar bens tombados (vide art.5º, letra k, do decreto-lei federal Nº 3.365, de 21 /6 / 94), embora não seja obrigado a fazê-lo.
4. O decreto-lei Federal, Nº 2.809, de 23 de 11 de 1940, dispõe sobre a aceitação de donativos particulares pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
5. Os tribunais têm admitido ação combinatória para impedir a construção ou obter demolição de obra que prejudique a visibilidade de bem tombado (cf. Acórdãos: Supremo Tribunal Federal, In “Rev. Trimestral de Jurisprudência”, 6/496 – Tribunal Federal de Recursos, in “Rev. de Direito da Procuradoria Geral da Prefeitura” do antigo Distrito Federal, 3 /244).
Nenhum comentário:
Postar um comentário